Páginas

terça-feira, 3 de maio de 2011

[Conto] Vagar pelas Ruas


Vagar pelas ruas sem rumo, tem sido minha única opção nos últimos tempos. Tenho conhecido lugares dos quais nunca imaginei que existiriam, vejo o cotidiano de muitas pessoas, vejo carros nos sinais, trabalhadores de rua, pessoas discutindo, crianças brincando, donas de casa estendendo suas roupas no varal, mas, desde aquele dia, tudo parece estar muito vazio ao meu redor...
Sinto-me como se eu não existisse, como se ninguém pudesse me ver, não que eu queira ser notado, mas as pessoas passam por mim nas ruas, e não me veem, me sinto tão isolado quanto um cachorro sarnento em meios às ruas de uma metrópole. 
Em um momento do dia eu paro e observo a saída dos alunos de uma escola: Assim que o sino bate, todos saem correndo, como se tivessem sido libertados de uma servidão eterna, e pudessem viver uma nova vida,  eles correm e se empurram, mas sempre focados em encontrar seus pais em meio à multidão na porta da escola, e em seguida contar-lhes as novidades enquanto vão tomar um sorvete ou almoçar em algum restaurante da cidade. O mais angustiante dessa linda cena, é que em nenhum momento sequer, alguém percebeu que eu estava ali, observando a felicidade de todos ao encontrarem seus familiares, apenas um cachorro olhava para mim, como se fosse o único que pudesse me ver ele deu alguns latidos como que se fosse para chamar minha atenção, mas quando olho para ele, ele me encara por alguns segundos se vira e sai, me deixando de novo no completo abandono. Passados alguns minutos, tudo volta ao normal, a rua fica deserta, já não há mais crianças nem cachorros nem ninguém em frente à escola, a não ser eu, e os carros que passam apressados pela rua. Eu caminho mais um pouco lentamente, pois não tenho pressa para chegar a lugar nenhum, e logo me deparo com uma sorveteria, outro lugar muito alegre, as pessoas se deliciando com lindos sorvetes, coloridos e imensos. Eu fico um pouco olhando a cena e me vem por impulso uma vontade louca de pedir um sorvete, de voltar a me lembrar de como era bom o gosto de um, mas logo me vem à tona a dura realidade de que não tenho dinheiro e também como sei que o sorveteiro como todas as outras pessoas não irá me notar, eu resolvo fazer o que tenho feito de melhor, em meio às lágrimas, viro as costas para a sorveteria e continuo andando, vou andando sem rumo, na inútil esperança de encontrar algo que me faça parar essa caminhada sem destino, mesmo sabendo no fundo do meu íntimo, que não resta nenhuma esperança mesmo para mim.
A maior dor que sinto não é a de não comer nada há tempos, mas sim a de não ter com quem falar, essa vida solitária tem me perturbado, a cada dia que se passa eu espero em vão encontrar alguém com quem vou poder conversar, mas sei que é uma esperança vã e inútil.
Após toda essa melancolia, algumas imagens me veem à cabeça, e me lembro do dia em que não quero me lembrar, o terrível dia 13 de Setembro, em que dirigia meu conversível em uma estrada deserta, voltando de madrugada de uma festa sozinho, sob efeito de drogas ou álcool, não me lembro exatamente, e não percebi a curva na estrada e o ultimo flash que tenho na memória daquela cena me remete à pedreira cada vez mais próxima de mim, e a única atitude que consegui tomar naquela hora foi a de observar, como um condenado observa o seu executor acionando a cadeira elétrica ou liberando o gás letal, como um simples observador admirei a cena: a batida, os barulhos dos meus ossos se juntando à ferragem do carro, o meu sangue se misturando ao óleo que se derramava na estrada, e enfim a explosão.
E então, a partir daquele dia, sinto como se não houvesse mais nenhuma esperança para mim, a não ser vagar pelas ruas sem rumo.

10 comentários:

  1. Cara, bom trabalho. Que esse seja o primeiro de um trabalho farto e que possa realizar o sonho de publicar livros com seus contos. Sucesso!!!

    ResponderExcluir
  2. Cara ficou muito fera, e gostei principalmente do desfecho. Se depois quiser conversar no msn de boa. Parabéns continue assim. Me inspirou a escrever mais uma de minhas poesias.

    ResponderExcluir
  3. Anônimo3/5/11 10:54

    Já lí e adooorei!
    Parabéns e sucesso nessa empreitada.
    Que seja o primeiro de muitos que virão pela frente se Deus quizer.
    Isaura Leal

    ResponderExcluir
  4. Anônimo3/5/11 12:41

    Amorzinho, adorei ficou muito bom, espero que vc continue com essa animação e escrev muito mais.
    Te amo muito.
    Flaviane

    ResponderExcluir
  5. Anônimo3/5/11 20:32

    Cara, ficou bom heim!!!
    Parabéns, força nessa sua nova carreira.
    EPMartins

    ResponderExcluir
  6. Parabéns Ronie!
    Muito bom!
    E essa talvez seja uma das maiores 'punições'!
    Vi um filme na escola uma vez que tratava do suicídio e a religião, onde o preço que se pagava pelo suicídio, era mais ou menos o estar em meio a multidão, mas sentindo-se como se estivesse só. Associei o conto ao filme, as idéias são parecidas..
    Caso eu lembre do título, te falo..
    Abraços, sucesso!

    ResponderExcluir
  7. Muito interessante! Este conto me lembra um livro que li uma vez sobre uma garota que pensava sobre a sua vida depois que ela já estava morta.

    ResponderExcluir
  8. Bacana. Me dei conta durante a leitura. Existem N livros com essa temática, quem sabe procura algum para aguçar a criatividade.

    ResponderExcluir
  9. Lindo conto!!!

    Vem bem de encontro ao que acredito, de que nossa história não termina aqui!
    Também acredito nas pessoas que encontra o "caminho da luz"!

    Adoreii!!!

    Abraços!

    ResponderExcluir
  10. Caramba!!! Ficou ótimo!!!!

    ResponderExcluir